Snowballer Convida #8: Lucas Lameiras fala sobre o framework de investimento em venture capital.
Ei amigos e amigas! Esta é uma edição extra para assinantes desta newsletter, projetada para torná-lo um melhor investidor.
Os membros têm acesso às estratégias, táticas e sabedoria de investidores e fundadores excepcionais.
A cada edição, convidarei alguém que eu considero relevante na nossa indústria para partilhar sobre tópicos atuais e atemporais, nesta edição temos um texto do meu amigo Lucas Lameiras.
Lucas é um investidor independente. Ele atua como scout para a Andreessen Horowitz, e teve passagens por Atlântico e Atmos Capital.
Também trabalhou em empresas do grupo 3G Capital em Londres, onde morou por quase uma década. Hoje reside no Rio de Janeiro.
A literatura sobre Venture Capital em português deixa a desejar. Em qualquer livraria de Londres ou Nova Iorque, os olhos se perdem numa infinitude de livros dedicados à empreendedorismo, tecnologia e investimentos.
Quando o assuntos são Blogs, obras seminais compõe a base do conhecimento sobre startups em inglês; AVC (Fred Wilson), Above the Crowd (Bill Gurley), e Essays (Paul Graham) educaram gerações de empreendedores e investidores de risco.
No Brasil é mais comum encontrarmos textos que remetem à auto-ajuda. Por aqui até o “workterteinment” exige lupa e peneira.
Com isso em mente, descrevemos abaixo, em portugês, e sem verborragia, os principais critérios utilizados por gestores de VC no processo de escolha de seus investimentos.
Ou em outras palavras: o que realmente importa na tal da “Due Dilligence”?
Power Law, Schrödinger, e as idiossincrasias do fantástico - e terrível - mundo das startups early-stage
“Em 2000, o Nasdaq sofreu um colapso e o fundo de Growth do Sequoia perdeu 2/3 do seu valor. Eram os sócios do early-stage que o gerenciavam. Em 2005, Moritz e Leone levantaram novamente, desta vez contratando 5 investidores de growth.
Os recém-chegados, em sua maioria do Summit Partners, tinham sido treinados para investir em empresas obscuras que nunca haviam recebido capital de risco. A maioria desses empreendedores ficavam fora do Vale do Silício, e alguns não tinham nenhuma conexão com tecnologia.
O time ex-Summit modelava receitas e custos para chegar a uma projeção de ganhos, aplicando um múltiplo padrão que calculava o valor justo das empresas. Sua meta para cada posição era 3x. Pagar demais poderia transformar uma aposta sólida num cemitério de retornos.
Os novatos eram como alienígenas em uma reunião tribal. Eles importaram sua própria metodologia, enquanto seus colegas treinados pela Sequoia continuavam a aplicar a mentalidade de early-stage aos negócios de growth.
O time do Summit sentava em mesas abaixo das escadas, fazendo cold-calls e inserindo números em planilhas; eles estavam lidando com a realidade.
O pessoal da Sequoia sentava um andar acima, sob um teto em forma de pirâmide com uma claraboia brilhante: eles estavam contemplando o potencial.
Os dois grupos selecionavam tipos completamente diferentes de empresas. “Nós encontrávamos investimentos que estavam claramente funcionando, mas que não eram muito emocionantes. Já o time treinado pela Sequoia encontrava coisas que eram super emocionantes, mas que talvez não estivessem funcionando.”
As subestimações do Summit, combinadas com as superestimações do Sequoia, produziuram um desempenho medíocre. Os LPs da gestora começaram a ficar inquietos. Mas em pouco tempo, por volta de 2009, os estilos conflitantes se uniram e a performance virou a chave. As pessoas do Summit aprenderam a sonhar, e o time de early-stage da Sequoia internalizou a disciplina de seus novos colegas.”
(MALLABY, SEBASTIAN - Power Law. Adaptado da versão original em Inglês, pg. 324-326.)
Gestoras de ações e fundos de Growth precificam companhias por cálculos de fluxo de caixa descontados e/ou múltiplos comparáveis.
Análises sherlockianas são convertidas em números exatos numa longa - e muitíssimo bem formatada - planilha.
Só então o mix de margem e crescimento projetados informa uma potencial diferença entre valor e preço.
Tal metodologia, psicologicamente confortável por sua suposta precisão, contrasta com a realidade do processo de investimento - e construção do portfólio - nos melhores fundos de early-stage.
“A primeira regra de um investimento é não perder dinheiro. A segunda regra de um investimento é não esquecer a primeira regra.” - Famoso aforismo de Warren Buffett
Isso acontece pois, sob a ótica de um Venture Capitalist, investimentos em startups costumam apresentar retornos binários.
Cada investimento é feito com o objetivo de retornar o fundo por completo; afinal boa parte das startups investidas por gestoras de excelência na verdade perde dinheiro.
Repare: fundos que retornam >5x perdem dinheiro com mais frequência que seus pares 2-3x.
Como podemos observar nos gráficos acima, disponibilizados em artigo da Andreessen Horowitz, os home runs para bons fundos de venture estão em torno de 20x; mas a média dos home runs para fundos de excelência estão em quase 70x.
Investir em startups é um exercício de maximização de upside. O conceito de “Power Law” - tão presente na vida e tão explícito em Venture Capital - faz com que todo fundo de venture, independente de quão conhecida seja a gestora, esteja ao mesmo tempo vivo e morto.
Um brinde aqueles que buscam racionalizar a não-gaussianidade do nosso mundo.
Critérios fundamentais de avaliação para investimentos em early-stage
Em investimentos, cada gestora é como um chef que segue uma receita única.
Ingredientes essenciais — como mercado, equipe e produto — são comuns a todos, mas cada fundo traz seu próprio toque, ajustando os temperos e proporções de acordo com suas preferências.
Cada sócio adiciona sua assinatura pessoal ao prato, infundindo perspectivas e vieses ao processo definido pelo time.
Um bom framework de análise funciona como uma receita bem elaborada: ele simplifica a complexidade, proporcionando uma base sólida sobre a qual é possível ajustar conforme necessário.
Embora cada fundo siga uma parametrização própria, todos começam com os mesmos ingredientes básicos. A partir daí criam algo único e adaptado ao seu paladar.
Olhemos primeiro à tríade original: Market, People, Product.
Mercado
O mercado em que uma startup atua costuma ser o principal critério de avaliação por parte do VC.
Ou ao menos é seu critério de veto mais comum. Afinal, numa classe de ativos onde o que importa de fato é “quão grande a companhia pode ficar”, é necessário que o mercado endereçável comporte receitas multi-bilionárias em dólar.
Gestores de VC buscam startups que operam em mercados muito grandes (ie: Crédito; responsável por 70% do Profit Pool em financial services) ou em rápida expansão (ie: infraestrutura de FIDICs).
É possível também que o mercado endereçado seja relativamente pequeno no momento atual, desde que algum breakthrough tecnológico ou transformação regulatória permita que tal mercado cresça em alta velocidade (ie: pagamentos digitais após a mudança que permitiu a existência de Pags, Stone e CloudWalk. afinal, antigamente seu taxista não aceitava cartão).
Time
“Equipe” é possivelmente o critério mais subjetivo no processo de escolha de um fundo.
Este quesito se resume à confiança do investidor na capacidade de execução e atração de talentos dos fundadores. Isso é feito com base na extrapolação de conquistas passadas por parte do time, e no estilo de cada gestor.
A verdade é que cada sócio em cada casa tem sua preferência - e seus vieses.
Ao olhar o portfólio de um VC é relativamente fácil encontrar padrões. Alguns preferem o founder “super-herói”, outros o “artista”, o founder “perfeito” ou o “nerd”.
Existem VCs que só investem em “2nd time founders”, que gostam dos “MBA’s”, e tem até mesmo aqueles - eu incluso - que costumam favorecer pessoas minimamente esquisitas, obcecadas, ou até difíceis.
É impossível agradar a todos. O importante é encontrar quem se alinha com o seu estilo.
Produto
O critério “produto” significa acima de tudo a maneira concreta com que você e seu time buscam resolver um problema.
Por exemplo, o “produto” inovador do Nubank, ao meu ver, não foi meramente levar o conceito de banco para o telefone.
Afinal, todo incumbente possui um banco digital. O produto que fez o Nubank se tornar o Nubank foi permitir o acesso a crédito de qualidade em escala e sem burocracia.
Isso só foi possível através da construção de um produto pensado em tecnologia from first principles; que possibilitou à empresa atender seus clientes com custos competitivos e um nível de serviço incomparável ao que existia na época.
Ademais, o que você está construindo e a maneira como aborda um problema nem sempre são definitivos.
É relativamente comum que startups em estágio inicial façam mudanças - ou pivots - ao longo do tempo. Por isso, é fundamental entender a lógica que o empreendedor utiliza ao descrever seu produto.
Se o investidor conseguir desconstruir essa lógica em uma primeira conversa, provavelmente seu entendimento sobre o produto ainda não atingiu o nível ideal.
PS: Os melhores produtos se destacam por serem diferentes, não apenas melhores.
Critérios adicionais de avaliação para investimentos em early-stage
MOAT (Vantagem Competitiva)
Empresas que demonstram alta qualidade ao longo dos anos costumam ser copiadas. Por que seu produto resistirá ao ataque - e às imitações - dos concorrentes?
Se um incumbente desejar fazer algo similar, como isso afetará seus cohorts? Porque você conseguirá manter sua liderança de mercado?
Seja uma tecnologia difícil de ser replicada, acesso à capital com custo mais barato, capacidade de atrair talentos de elite em escala, efeitos de rede, canal de distribuição ou parceria específicos, ou, no Brasil, até mesmo a composição de um captable que impeça novos entrantes.
Vantagem competitiva é o que diferencia uma companhia perene de seus concorrentes. Sem um MOAT claro, dificilmente sua startup irá vencer a solitária corrida do longo-prazo.
Tração
Tração refere-se ao crescimento e à aceitação de um produto no mercado. Indicadores como o número de clientes, receita, margem e taxa de crescimento são analisados para avaliar o progresso da startup.
Prepare sua análise de cohorts; investidores preferem empresas que já demonstram algum sucesso inicial e possuem evidências claras de demanda por seu produto ou serviço.
Ou preferem uma grande promessa, no Power Point.
Ver também: Tração artificial e a percepção equivocada de Product-Market fit.
Distribuição / GTM
Em Venture Capital, um produto bom com excelente distribuição geralmente supera um produto excelente com distribuição apenas boa.
Para o investidor de VC, é crucial entender como atrair clientes de forma econômica e escalável. Descobrir um "hack" na estratégia Go-To-Market (GTM) frequentemente leva a resultados positivos.
O Nubank é um exemplo claro: sua base de mais de 90 milhões de usuários oferece hoje uma vantagem robusta na distribuição de novos produtos financeiros B2C.
Modelo de Negócios
Como um grande amigo disse certa vez, no fim das contas, em negócios é fundamental responder objetivamente a uma pergunta muito simples: "Como você vai ganhar dinheiro?".
No contexto de Venture Capital, sua forma de "ganhar dinheiro" deve ser o mais replicável e escalável possível. Simples, não é?
Potential
E, por fim, se tudo der certo… quão grande o negócio pode se tornar?
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